sexta-feira, dezembro 29, 2006

Bromazepam em falta

Esta semana eu me apaixonei por você.
Simples assim, acordei e puff!
É a fragilidade desse seu ar de maturidade completamente pueril. Eu nem tô falando de sexo (esta semana), nem nada, tô falando de paixão preguiçosa, querido... sabe aquele conforto de criança assistindo Sessão da Tarde? Então escova os dentes com Tandy e vamos contar carneirinhos... porque crescer nos trouxe insônia.
An? Ah, não, nada...

segunda-feira, outubro 30, 2006

Dentro do Espelho

Ela não parece acreditar em muitas coisas...
Atravessa ruas e ruas, por entre pessoas e pessoas (das ruas ela parece gostar)
Por vezes, alguma garotinha de saia, olheiras e meias três quartos a fazem virar os olhos. Não mais que poucos segundos; algumas horas de uma mesma noite, no máximo...
Olhando assim, não se diria que ela odeia alguém. O estranho é que também não demonstra qualquer tipo de afeição.Daqui eu nunca a vi com rapazinho algum, nem guriazinha ou coisa do tipo. Nem é dada a escândalos; aqui neste prédio, alguém perguntou, poucos sabem seu nome ou sequer de sua existência (ah, claro, a filha da...).
Eu não creio muito nessas coisas, mas essa aí, pra mim, tem algo de sobrenatural. "Isso" não tem vida, não ri (eu nunca vi), mal sai de casa (não fossem as obrigações automáticas...) e o quarto amanhece à meia luz, às vezes na sala, mas lá é coisa que ver não posso.
Às vezes, raramente, ela me olha. Olhos fixos nos meus. Chega a dar arrepios...
porque é como se não me visse...
Como se o morto fosse eu!

sábado, outubro 28, 2006

Isso não é arte!

Um escuro considerável... só uma luz esverdeada cantando Smiths na sala vazia.
Nas mãos uma caneca com chocolate gelado.
pantufas. Lembranças sabor algodão-doce...
Na cama, livros que deveriam ser lidos.
Solidão confortável.
Só hoje, a porta poderia não abrir...
Só hoje, alguém poderia não entrar...
Sozinha entre pensamentos e cds...
Meu pijama é azul e me abraça...

para um gato preguiçoso

Uma madrugada de julho de 20... Na Avenida..., o ônibus pára. Ela anda com passos despreocupados. O vento frio do inverno sempre a faz sentir-se bem. De repente, sente uma presença. Um homem. Estranho. Caminha apressado. Está a seu lado. Ela também apressa o passo. Lado a lado. Ofegante. Na rua, não mais que um ou outro carro passando. O silêncio. Os passos de um desconhecido. Nada mais. Ela dobra à direita e entra na Rua da... O desconhecido também. Ele parece correr; ela não agüenta mais. Tosse. Recupera o fôlego. O desconhecido atravessa a sua frente. Desespero! Então, enxerga seu prédio. Abre a porta com um sorriso infantil que pensava não ter mais. O desconhecido seguiu. Deve morar mais adiante. Ela venceu! Chega em seu pequeno apartamento vazio, feliz por ter vencido. Gostaria de conhecer o desconhecido. Queria ligar, ou mesmo gritar da janela “hei, bobão, cheguei primeiro”, rir e mostrar a língua. Mas não, que tola! Pega o gato no colo e conta o que acabara de acontecer. Beijou o animal que, em resposta preguiçosa, saltou de seu colo. Gatos!
No chão, o vídeo que editara à tarde. Precisava dormir. Deveria apresentar o vídeo pela manhã.

Naqueles instantes antes de dormir, talvez percebesse que sua vida não era mais o plano de uma adolescente. Não, era real. As almofadas coloridas e inertes que abraçava à noite eram reais.

Talvez pensasse nas horas...
Que horas são?
Ninguém responde.
Que horas são?
Já não importa.
Talvez tenha ouvido um barulho na cozinha...
Quem está aí?
Outro gato.
Sorri e adormece.
Hoje ela teve uma história.
Tola, só sua... mas teve uma história.

* eu tinha citado os nomes da avenida e rua que imaginei quando escrevi, mas achei melhor não colocá-los por qualquer coisa que me ocorreu de repente... enfim... portoalegrês-demais-e...

Vertigem

Ele disse que deixou cair a cocaína dela no ralo, por isso o arranhão perto do olho. E disse que, por isso também, ela cheirou os cds de jazz dele. E, talvez por isso, jazz aqui o corpo da mulher.
Amor, anda, tu tem aula, guri! Ele fica bonito assim, de cabelos desgrenhados e cara de preguiça, física quântica, ele tem aula daqui a pouquinho, eu falto também, às vezes, mas eu não tenho um arranhão ali no canto esquerdo do rosto, bem perto do olho, que perigo se pega! Ou talvez eu tenha e o espelho é que não ajuda, velho demais, pequeno demais, marcado demais esse espelho, talvez eu tenha uma cicatriz. Amor, eu tenho uma cicatriz! Tá acabando a pasta de dente, corta, ai, eu odeio água gelada, sabe? assim, pela manhã, não tem coisa pior. Olha da janela, viu?, que espelunca, a cama desfeita, e a mulher ali dorme tão bonita, né? Mas não era janela, era o espelho, amor, era o espelho! Aquela mulher arranhou ele, sabe, e levou o cd da Billie Holliday, eu não entendo de jazz, o guri que gosta, não empresta nem pra mim e ela levou, aquela puta. Ah, a mulher chegou cedo, ela disse que queria falar com o guri, mas ele não tava e eu coloquei um cd, ela era engraçada e tão bonita. Amor, ela era bonita, ela te esperava, mas tu demorou! Nós dançamos, sabe, ela me fez rir tanto, ai. Pega a colher, na cozinha, ai, deixa que eu pego; ela veio pra cozinha, mas só tinha colher de sobremesa, "colher de sobremesa", ela riu, e comeu uma maçã também, porque tinha maçã. A colher de sobremesa, tinha mousse, depois eu lembrei. Amor, tem mousse ainda, come antes de ir! ele gosta de mousse, eu fiz mousse essa semana e ainda tinha, ela queria falar com ele, e ele podia demorar e ela ia sentir fome, mas tinha mousse. "colher de sobremesa", como ela ria. Eu vou te mostrar o que eu trouxe - ela me mostrou o que ela trouxe. Amor, sabe o que ela trouxe? Amor? já foi pra aula o guri, eu odeio física quântica, sabe? se ele soubesse o que ela trouxe... Sua puta, olha que tu fez? ela gritou comigo nessa hora... Amor, não foi tu, fui eu, amor fui eu, eu deixei cair no ralo, ai, mas ela queria falar contigo, mas tu demorou tanto e ela riu da colher e tinha pouco mousse! Amor? Abre a porta, não me deixa sozinha e, moço, diz pro guri vir logo, eu não gosto de ficar sozinha e tem uma moça querendo falar com ele...

bastidores

Engraçado assistir a um filme qualquer no final de um dia monótono!
É como se a arte enganasse a vida, fazendo algum sentido interessante por menos de duas horas. Poderia o dia ter sido melhor: o filme não era tão bom assim.
Sentar no sofá, apagar a luz, ligar o DVD e viver um pouco.
Confortável.
Anestésico.
Alguns sonhos são assim. Deitar, apagar a luz, dormir e viver um pouco.

este não é um motivo

Ela gostava daquelas cores. O céu escuro, o amarelo febril dos postes da cidade, e o gozo dessa relação escancarado no concreto dos edifícios. Sentia-se cúmplice. Confidente. Voyer dessa perversão-intra-cromática. Porque o vermelho, à noite, não é vermelho puro, e o azul nem tão azul assim... O segredo da noite urbana que perverte as cores também era dela.
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